O ativista chinês Liu Xiaobo não sabe que recebeu o Prêmio Nobel da Paz, anunciado hoje (8) em Oslo, na Noruega, porque se encontra incomunicável na prisão, onde cumpre 11 anos de condenação por reivindicar a democracia em seu país, segundo seus dois advogados, Mo Shaoping e Pu Zhiqiang.
"Estou muito contente", assegurou Pu, que é amigo de Xiaobo desde 1989, quando ambos se conheceram nas manifestações pró-democráticas de estudantes na praça de Praça da Paz Celestial que em 4 de junho terminaram em um massacre do Exército.
Mo também disse se sentir muito feliz: "Que Liu tenha ganhado o prêmio é um orgulho para todos. Agora é um chinês que vive na China, e não um exilado (como o Dalai Lama ou o escritor Gao Xingjian, Nobel de Literatura em 2000) que recebeu um Nobel".
Para estes dois advogados e amigos de Liu, a decisão do instituto norueguês significa "que a sociedade civil internacional reconhece o trabalho de Liu Xiaobo pela democracia e pela aplicação da lei na China".
Os dois advogados expressaram suas dúvidas sobre quem receberá o prêmio do Instituto Nobel Norueguês, já que lhes consta que o governo não permitirá que Liu Xia, a mulher de Liu Xiaobo saia do país para tal.
Primeiro chinês a receber o Nobel da Paz
O ativista chinês Liu Xiaobo, um ex-professor de literatura, é o primeiro cidadão chinês a receber o prêmio. Ele passou os últimos 20 anos entrando e saindo das prisões chinesas por defender reformas democráticas.
Liu, de 54 anos, foi detido pela primeira vez após os célebres protestos do movimento estudantil na
praça da Paz Celestial, em Pequim, em junho de 1989, violentamente reprimidos pelo governo.
Liu foi preso novamente em 2008 por ter sido um dos 10 mil signatários da Carta 08, petição formulada para exigir reformas políticas no regime comunista chinês.
Em dezembro de 2009, o dissidente foi condenado a 11 anos de prisão por "subversão", em um julgamento que gerou uma onda de protestos por todo o mundo.
Ao anunciar o prêmio, o presidente do Comitê Nobel, Thorbjoern Jagland, afirmou que a China, segunda maior economia mundial, deveria assumir "mais responsabilidades" devido a seu cada vez mais importante papel no cenário internacional.
Liu receberá o prêmio "por seu longo trabalho não violento em favor dos direitos humanos na China", assinalou o Instituto. "O comitê Nobel deliberou largamente antes de tomar esta decisão que relaciona os direitos humanos e a paz".
"Nas últimas duas décadas, Liu Xiaobo foi um grande porta-voz em favor da aplicação dos direitos fundamentais na China", acrescentou a instituição.
China chama concessão de Nobel de "obscenidade"
Pequim já havia antecipado que Liu Xiaobo poderia ganhar o prêmio e fez
críticas à possível escolha, pois ela chama a atenção para a delicada situação dos direitos humanos no país.
Hoje o governo da China condenou fortemente a concessão do Prêmio Nobel da Paz para o dissidente chinês Liu Xiaobo, que está preso, qualificando-a de "uma obscenidade" que vai contra os objetivos da premiação.
A decisão vai prejudicar as relações sino-norueguesas, diz um comunicado do porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da China, Ma Zhaoxu, colocado em seu website, www.mfa.gov.cn.
"Esta é uma obscenidade contra o prêmio da paz", disse Ma.
Noruega tenta evitar reação negativa da China
O chanceler norueguês, Jonas Gahr Stoere, disse nesta sexta-feira que a concessão do Prêmio Nobel da Paz a um dissidente chinês não deve causar uma reação hostil de Pequim ao seu país.
"Não há motivos para dirigir qualquer medida contra a Noruega como país, e acho que haveria um efeito negativo sobre a reputação da China se ela assim agisse", disse Stoere a uma TV local.
A China reagiu com indignação ao Nobel da Paz dado nesta sexta-feira ao dissidente Liu Xiaobo, que foi condenado a 11 anos de prisão em 2009 por ter participado de um manifesto em prol da democracia na China.
O prêmio é concedido pelo Comitê Norueguês do Nobel, mas Stoere enfatizou que essa entidade é independente do governo da Noruega, que atualmente negocia um tratado comercial bilateral com Pequim.
Stoere admitiu, no entanto, que "não é segredo que há muitos anos a China tem dado uma série de alertas de que o prêmio da Paz a um dissidente chinês levaria a reações negativas".
Mulher de Xiaobo pede pressão pela libertação
A mulher do dissidente Liu Xiaobo, o recém nomeado prêmio Nobel da Paz, pediu hoje à comunidade internacional que aproveite esta oportunidade para pressionar pela libertação de seu marido, que cumpre pena de 11 anos de prisão.
"Espero que a comunidade internacional aproveite esta oportunidade para pressionar o governo chinês pela libertação do meu marido", assinalou em comunicado a poetisa Liu Xia, mulher de Xiaobo.
"Como o Comitê reconheceu, o novo status da China no mundo significa uma crescente responsabilidade. A China deve aceitar esta responsabilidade, sentir o orgulho de ter sido escolhida, e libertar meu marido", declarou.
Liu Xia, que está sob vigilância domiciliar na capital chinesa, disse sentir-se "agradecida ao Comitê Nobel por ter agraciado" seu marido, Liu Xiaobo, com o prêmio Nobel da Paz 2010.
"É uma verdadeira honra para ele, e sei que vai dizer que não merecia", acrescentou.
A poetisa, que se casou com Liu Xiaobo em 1996, declarou sua "sincera gratidão" ao "ex-presidente tcheco Václav Havel, a Sua Santidade Dalai Lama, ao arcebispo Desmond Tutu e a tantos outros que tão valentemente escolheram Liu para ganhar o prêmio".
Prêmio
O Prêmio Nobel da Paz é tradicionalmente entregue em Oslo no dia 10 de dezembro.
O Prêmio Nobel da Paz é atribuído todos os anos pelo Comitê Nobel da Noruega, composto por cinco pessoas indicadas pelo Parlamento norueguês. A composição do comitê reflete a relação de forças entre os partidos políticos no parlamento, e conta com o auxílio de consultores técnicos especialmente designados.
O Nobel é um dos cinco prêmios criados pelo sueco Alfred Nobel (1833-1896), o inventor da dinamite. Detentor de mais de 350 patentes, se tornou milionário em consequência de suas descobertas na área de explosivos. Nobel deixou, em seu testamento, um pedido: a criação de uma fundação para financiar, todos os anos, cinco prêmios internacionais.
O testamento de Nobel também relacionava as categorias da premiação: física, química, medicina, literatura e paz (destinado às pessoas que mais se empenhassem para levar a paz a todos os países). Na década de 60, foi adicionado o prêmio para economia.
As indicações ao prêmio Nobel da Paz podem ser feitas por parlamentares, ministros governantes, acadêmicos, integrantes de organizações internacionais e ganhadores de anos anteriores. De acordo com as regras dos comitês, as indicações são mantidas em sigilo por 50 anos, mas alguns nomes acabam vazando.
De acordo com o calendário do prêmio, em setembro, o comitê envia convites a pessoas consideradas qualificadas para fazer indicações para o prêmio do ano seguinte. Fevereiro é o prazo máximo para o comitê receber as indicações, que ficam por volta de 200, com muitas cartas indicando as mesmas pessoas. Entre fevereiro e março, o comitê elabora uma lista mais curta de indicados.
Até agosto, a lista é constantemente revisada por consultores permanentes do prêmio e outros contratados por conhecerem o perfil de candidatos específicos. Em outubro, o ganhador do Nobel da Paz é escolhido e tem seu nome anunciado.
A cerimônia de entrega do prêmio ocorre em dezembro, em Oslo, capital da Noruega. O laureado recebe uma medalha com o busto de Nobel, um diploma e uma soma de dinheiro. No ano passado, o presidente dos EUA, Barack Obama, escolhido Nobel da Paz, recebeu 10 milhões de coroas suecas (US$ 1,4 milhões).
http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/internacional/2010/10/08/incomunicavel-na-prisao-liu-xiaobo-nao-sabe-que-recebeu-nobel-da-paz.jhtm